Ouça a leitura desse concerto:

131º Concerto: Ravel e Beethoven

26 de janeiro de 1956
14 pessoas

Comentários ao 9º Programa fornecido à rádio 9 de Julho

Ravel

Na primeira parte deste programa da Discoteca pública Municipal serão apresentadas duas peças de Maurice Ravel.
A obra de Maurice Ravel constitui um dos pontos mais altos da música moderna francesa. Após um período de confusão inicial da crítica, em que erroneamente se viu nele um impressionista, um simples continuador ou repetidor de Debussy, percebeu-se que Ravel poderia dever alguma coisa a seu grande antecessor, como devia a seu mestre Gabriel Fauré, a alguns russos e a muitos outros músicos pelos quais ele próprio confessava sua admiração; mas percebeu-se também que seu espírito e sua linguagem eram totalmente diferentes dos de todos esses músicos e especialmente de Debussy, de quem ele tanto fora aproximado. À sugestão lírica, a vaga atmosfera de símbolos em que se move a música de Debussy, Ravel opunha uma emoção discreta, mas nitidamente definida. E com a espontaneidade criadora de Debussy contrastava a rebuscadíssima técnica de Ravel, mestre da forma, virtuose excepcional da instrumentação, perseguidor incansável do bem-acabado. Por tudo isso, Ravel ficou situado na história da moderna música francesa como um neoclássico, em cuja música se fundiram uma sensibilidade requintada e contida, e a perfeição técnica.
O “Tombeau de Couperin”, que abre nosso programa, é um dos muitos testemunhos da paciência, da consciência artística com que Ravel trabalhava: iniciado em 1914, só em 1917 o “Tombeau” estava concluído na sua versão primeira para piano. Em 1920 Ravel orquestrou, para um bailado, quatro dos seus seis trechos, excluindo a Fuga e a Tocata. Como música para bailado, o “Tombeau” teve pouco sucesso, mas a obra obteve tal êxito em concertos, que em 1921 Ravel dirigia a centésima execução pública dessa versão orquestral. O “Tombeau de Couperin” é realmente uma joia, em que vivacidade, elegância e um cálido mas recatado lirismo se mostram através de uma instrumentação extremamente sóbria e límpida. A sua “sonoridade sedosa e transparente”, obtida com poucos recursos, constitui, como bem acentuou alguém, uma verdadeira lição de “orquestração econômica”.
Por todos esses aspectos, o “Tombeau de Couperin” revela o admirador da música francesa do século XVIII, que Ravel realmente foi, e a plena consecução do fim que ele se propôs ao escrevê-lo; adaptar velhos cortes formais à técnica, à harmonia e à sensibilidade modernas. Couperin, grande músico francês setecentista, recebeu pois, nesse Tombeau que lhe foi consagrado, a mais adequada das homenagens: uma esplêndida continuação contemporânea das qualidades de clareza e elegância, que sempre marcaram o verdadeiro espírito musical da França.
A adaptação contemporânea de velhos moldes começa já pelo gênero-título (sic) que Ravel escolheu. A palavra francesa “Tombeau” (túmulo, em português) designa, em música, uma peça instrumental feita para celebrar a memória de uma pessoa ilustre. Os primeiros “Tombeaux” conhecidos datam do século XVI e o gênero atingiu sua maior voga no século XVIII. Desde o início, o “Tombeau” adotava formas de danças, como a Alemanda e a Pavana. No seu “Tombeau de Couperin”, Ravel recorre também a uma série de velhas danças, construindo com elas uma Suíte concebida no espírito das suítes a que Couperin chamou “Ordres”, isto é, Ordens. Na versão orquestral, que é a do nosso programa, ao Prelúdio que costumava abrir as Suítes, seguem-se: uma Furlana, dança do século XVII que, nascida na Itália, esteve em moda na França, nesse mesmo século; um Minuete, dança francesa também surgida no século XVII: ainda da França é o Rigodão conclusivo, dança de origem provençal que fez furor no século XVIII e é tida como criação do mestre de dança Rigaud, a quem ela deveria o seu nome francês de Rigaudon. A interpretação apresentada é da Orquestra Sinfônica de Minneapolis regida por Dimitri Mitropoulos.

Disco

Ravel (França, 1875-1937):
Le tombeau de Couperin



Duração: 50:45


Para encerrar a primeira parte deste programa, dedicada a Ravel, serão executadas as belas “Três Canções” para coro misto, sem acompanhamento, que o compositor escreveu sobre texto próprio. As canções que formam a série são: “Nicolette”, “Ronde” e “Trois beaux oiseaux du paradis”. A execução é do Coro Misto de Lyon, regido por Leon Vietti.

Disco

Ravel
Três Canções:



Duração: 06:27

Nicolette
Ronde
Trois beaux oiseaux du paradis
Execução do Coro Misto de Lyon, regido por Leon Vietti.

2ª parte

Beethoven

Um concerto de Beethoven encerrará este programa da Discoteca Pública Municipal.
Todos os que se interessam pela música conhecem os cinco famosos concertos que Beethoven escreveu para piano. Entretanto, raros serão os que saibam da existência do Concerto em Mi Bemol Maior, que conclui nosso programa de hoje. Beethoven escreveu aos 14 anos esse Concerto, de que apenas a parte do piano-condutor (sic) chegou até nós e foi revelada aos musicólogos em 1890, em publicação feita por Guido Adler. As partes de orquestra se perderam; mas como Beethoven registrara indicações sobre os tutti orquestrais na parte de piano, esta circunstância e a simplicidade do conjunto instrumental exigido, tornaram possível reconstituir, sem grandes riscos de erro, a obra completa.
Foi posto assim à disposição dos executantes e amadores de música, um documento curioso, onde podem ser examinados os primeiros passos artísticos do grande gênio alemão. Esse Concerto de 1784 é realmente uma obra de quase-infância (embora infância de gigante), cheia de várias falhas e imperfeições técnicas. Mas nele já se encontram processos e elementos que se caracterizariam mais tarde como tipicamente beethovianos.
Os tempos desses Concertos são três: Allegro moderato, Larghetto, Rondó (Allegretto). São executantes o pianista Orazio Frugoni e a Orquestra de Câmara Pro Musica regida por Paul Paray.

Disco

Beethoven (Alemanha, 1770-1827): Concerto em Mi Bemol Maior



Duração: 30:11

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