Ouça a leitura desse concerto:

90º Concerto: Hindemith e Grieg

28 de maio de 1954*
13 pessoas
1ª parte

Hindemith

A primeira parte do concerto de hoje apresenta um dos compositores mais respeitados da música alemã deste século: Paul Hindemith, nascido em 1895. A partir de 1921, Hindemith assumiu a posição de líder dos jovens compositores alemães e data de 1925 a consolidação de seu renome internacional. É por esse tempo que Hindemith atinge o pleno desenvolvimento de seu estilo e suscita uma onda de discussões. Estava-se então no período das intensas pesquisas de toda ordem - formais, rítmicas, de timbres, de sistemas sonoros; Hindemith também muitas fez, muitas enriqueceu com seu seguro conhecimento técnico e muito assustou os... assustáveis.
Como toda a música da fase heroica do modernismo, também a de Hindemith, procurando corrigir erros estéticos, caiu não raro num outro perigo: a secura e o intelectualismo excessivo, transformando-se muitas vezes em música mais para ser lida e admirada na inteligência e segurança da sua fatura, do que para ser ouvida. Tamanho empenho em pesquisar roubou a grande parte da música dessa fase, aquele dom humano de comunicação, tão necessário à obra de arte.
Entretanto, Hindemith é, curiosamente, um músico que desde sua maturidade se preocupou com o problema da relação entre a música moderna e as massas, preocupação expressa, por exemplo, nestas suas palavras: " ...a necessidade de música é tão grande, que se torna urgentemente necessário aos compositores e ouvintes chegarem ao menos a algum entendimento".
Foram certamente essas preocupações que levaram Hindemith a abandonar, em obras como a que hoje apresentamos, aquele atonalismo sistemático que tanta aridez emprestou às suas mais antigas composições e tanto concorreu para o desagrado do grande público. "Nobilissima visione" é uma suíte organizada por Hindemith com partes de um bailado do mesmo título, escrito em 1937 para o Ballet de Monte Carlo e inspirado em São Francisco de Assis. Em sua apresentação nos Estados Unidos, o bailado, adotando o nome do seu personagem central, passou a chamar-se "São Francisco". Hindemith esclareceu que a suíte "compreende as seções da partitura do bailado que sao autossuficientes e compreensíveis como música de conceito, independendo de uma ação teatral suplementar". E ele mesmo assim explicou os seus três movimentos:
"A Introdução constitui a parte da música original em que o herói da ação, São Francisco, está imerso em meditação profunda. O Rondó corresponde à música que, na partitura teatral, expressa a união mística do Santo com a Pobreza, numa cena inspirada em velha lenda toscana. A música reflete a paz bem-aventurada e a espiritual alegria com que os convidados participam do banquete nupcial, banquete que é apenas pão seco e água. O segundo movimento pinta a marcha de uma tropa de soldados medievais que, ouvida primeiro à distância, gradualmente se aproxima. A parte central desse movimento sugere a brutalidade com que esses mercenários atacam um viajante e o roubam. O terceiro e último movimento corresponde ao trecho da partitura do bailado que representa o Hino ao Sol. Nele todas as personificações simbólicas da existência celestial e terrena misturam-se no decorrer das diferentes Variações em que é transformado o tema da Passacalha. No bailado esta peça conclusiva possui um título especial, tomado ao cabeçalho de um capítulo de antiga versão do "Cântico do Sol", onde se lê: "Aqui principiam os louvores de todas as criaturas".
"Nobilissima Visione" recebeu do escritor francês François Mauriac esta apreciação: "Devemos pensar que foi na pobreza e através da pobreza que São Francisco, este príncipe entre homens jovens, alcançou o Cristo. (...) Nunca eu teria acreditado que esta paixão, (...) este desejo ardente de pobreza que Cristo amou, pudesse ser realizado para nós em música e dança. Mas esse milagre aconteceu. Ele é aquilo que São Francisco de Assis compreendeu tão bem: a reconciliação entre a natureza e o espírito de misericórdia".

(Fontes: comentário do 69º concerto; comentário que acompanha a gravação.)

Hindemith (Alemanha, 1895-1963): Nobilissima visione



Duração: 44:07


2ª parte

Grieg

Grieg é o mais conhecido compositor norueguês e certamente ainda o mais interessante do seu país.
Não se pode dizer que Grieg tenha sido um compositor de grandes recursos e de grande fôlego. Sua obra, incontestavelmente característica do movimento norueguês de nacionalização musical, e por isso importante, tem seus melhores momentos nas canções e nas peças curtas para piano, peças características evocando cenas e impressões, íntimas e elegantes, mas também eivadas, como toda a obra de Grieg, de uma boa dose de banalidade e sofrendo do que Paul de Stoecklin definiu muito bem como sendo "falta de valor orgânico" ("Grieg", p. 62).
As duas suítes "Peer Gynt", escritas para uma peça de Ibsen, e o Concerto em Lá menor, op. 16, apresentado neste programa, são as obras geralmente mais conhecidas e apreciadas de Grieg. Sobre esse concerto, assim escreveu Paul de Stoecklin:
"Foi em 1868, durante uma vilegiatura em Sölleröd, aldeiazinha dinamarquesa, que Grieg escreveu esta peça transbordante de alegria, perfumada dos hálitos primaveris, envolta em brumas doiradas de sol, de uma eloquência delicada e poética.
O primeiro movimento, Allegro molto moderato, é simultaneamente vivo e sonhador. Os temas evoluem do Menor ao Maior com uma graça infinitamente expressiva.
O segundo movimento, Adagio, é um intermédio idílico embebido de poesia. O terceiro, Allegro marcato, é uma verdadeira dança popular, vigorosa, flexível e variada. Há em tudo uma riqueza de vida, de movimento, de alegria, alegria discreta, apenas sombreada por uma suave melancolia, marcada pela tonalidade menor e sustentada por uma orquestração fluida, bonita, adejante, viva e clara. Mais que qualquer outra, salvo as peças líricas e Peer Gynt, esta obra consolidou a fama de Grieg".

(Comentário de Stoecklin extraído do 19º Concerto.)2

Atendendo a solicitações feitas por alguns consulentes da Discoteca, damos mais uma vez em nossas audições, o "Concerto em Lá menor, op.16” de Grieg.

Grieg (Noruega, 1843-1907): Concerto em Lá Menor, op. 16, para piano



Duração: 27:24

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** Repetição parcial dos concertos 19º, 21º e 69º

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