Ouça a leitura desse concerto:

110º Concerto: Poulenc e Haydn

24 de março de 1955
1 pessoa

[1ª parte

Francis Poulenc

Mais ou menos em 1910, tornou-se alvo de atenção, pela linguagem estranha, angustiosa e satírica de sua música, o compositor francês Erik Satie. Suas obras cheias de dissonâncias e completamente incompreensíveis para os ouvidos da época, foram entusiasticamente acolhidas por um grupo de jovens compositores, que procuravam meios novos de expressão. Poulenc, Honegger, Milhaud, Tailleferre, Durey, reuniam-se frequentemente sob a orientação de Satie, para discutir problemas de estética e técnica musicais. Este grupo de amigos, que foi chamado "Grupo dos Seis", se caracterizou principalmente pela revolta contra o impressionismo.
Interessante é notar-se que toda a revolução processada na música francesa moderna foi realizada dentro de caraterísticas já adquiridas e perfeitamente incorporadas ao patrimônio musical da França. Desde o movimento de valorização da música sinfônica, iniciado por Saint-Saëns e Lalo, já se notava essa tendência de "inovar dentro da tradição". Como consequência lógica do nacionalismo musical, deu-se uma fuga constante e procurada para o passado, para aquele passado luminoso de Luly e Rameau, os músicos mais nacionalmente franceses dos séculos XVII-XVIII, apesar da influência italiana que sofreram. Fauré, que cultivou dentro do mais puro classicismo uma linguagem musical toda francesa, indicou a diretriz a ser trilhada pelos jovens músicos: "o gosto pela clareza do pensamento, pela sobriedade e pela pureza da forma”. Debussy reanimou o estilo admirável dos cravistas franceses e dos mestres da Renascença. Ao lirismo admirável, às tonalidades justapostas do impressionismo, Satie opunha a clareza um tanto sarcástica de sua música, música intelectualizada de fim de civilização, pretendendo refletir o dinamismo material e angustioso dos anos trágicos que precederam e seguiram a primeira grande guerra. E foi com esse espírito que Erik Satie reuniu em torno de si aqueles moços, de temperamentos e de origens diversas, residindo talvez nessa diferença de sensibilidade e de origem, a falta de unidade estética do grupo, de existência tão efêmera.
Francis Poulenc, um dos representantes do "Grupo dos Seis", nasceu em 1899, em Paris. Sua música possui uma simplicidade, um timbre colorido, uma forte ironia que o tornam senão o músico mais vigoroso, pelo menos o mais representativo do agrupamento de Satie. Suas obras marcantes são as da juventude, as desse período dos "Seis", para cuja apreciação elas são indispensáveis. Pertencem a essa fase as obras incluídas no programa de hoje, que exemplificam suas composições para piano e mostram, através da Sonata (ou Trio) para pistão, trompa e trombone, as pesquisas de timbres que orientaram a sua música de câmara, como a de outros músicos europeus da mesma fase. Possivelmente as dissonâncias, a simplicidade extrema, os próprios timbres escolhidos ainda hoje tornam esta sonata difícil para muitos ouvintes, apesar de ter sido escrita há trinta e três anos atrás. Entretanto, ela tem, como acentua Edwin Evans, "passagens inteiras de uma limpidez quase mozartiana". E se não nos for possível gostar dela, é preciso não esquecer outras palavras do mesmo crítico: "Se o ouvinte é hostil a essa música, pode ir além e falar em puerilidades. Não se pode discutir essas puerilidades pois que, no fim de contas, o efeito delas depende de idiossincrasias pessoais do paladar musical. Nem toda a gente gosta de azeitona."

Fonte para apreciação da obra: "Cobbett's Cyclopedic Survey of Chamber Music"

Dados gerais: adaptação do comentário ao17º Concerto de Discos.O. A.
I. S*

Francis Jean Marcel Poulenc (França, 1899-1963):
Pastoral, de L'Eventail de Jeanne – nº 8



Duração: 02:14

Trois Piéces pour le piano – nº 2 Tocata



Duração: 09:02

Trio, para pistão, trombone e trompa



Duração: 08:28

[2ª parte]

Franz Joseph Haydn

Franz Joseph Haydn, compositor austríaco, foi o fixador da forma clássica da Sinfonia. Nesta forma escreveu nada menos de 104 composições cheias de graça, de ingenuidade, da alegria espontânea e moça, que são os traços mais característicos da pura beleza musical das suas obras.
Entre as suas sintonias, geralmente são consideradas mais importantes as que compôs para duas séries de concertos que, a partir de 1790, realizou em Londres a convite do empresário Salomão.
Ao lado da sua estrutura técnica vigorosa e segura, essas obras da plena maturidade do gênio de Haydn revelam um ponto que as diferencia das suas antecessoras: - a alegria despreocupada é substituída nelas por uma comoção maior, por marcas de um sentimento mais sofrido e mais rico, atribuíveis a inteligência que o grande mestre recebeu então do gênio mais inquieto do seu jovem amigo Mozart.
Dessas admiráveis "Sinfonias de Londres" ou "Sinfonias de Salomão", como são chamadas, vamos ouvir hoje a 10ª, que tem o nº 99 no catálogo geral das sinfonias de Haydn.
Após o grave recolhimento de uma introdução lenta, na qual perpassam vibrações dramáticas, desencadeia-se a alegria forte e sã do primeiro movimento - Vivace assai - alegria que o 2º tema, vagamente melancólico, colore de tons suaves.
Ao passo que Mozart apresenta, nas suas Sinfonias e demais peças construídas segundo o plano da sonata, uma temática de proporções relativamente desenvolvidas, a invenção musical de Haydn caracteriza-se pelos temas curtos. Observe-se neste movimento como é pequeno não só o rítmico e incisivo primeiro tema, mas também o 2º, a que todos os compositores costumam emprestar maior amplidão melódica.
O Adagio - 2º movimento - não é o momento mais feliz desta sinfonia. Faltava a Haydn aquele calor de paixão, aquela intensidade de vida interior que dão força aos movimentos lentos. Sente-se que o luminoso gênio haydniano tem pouca coisa a nos contar nos adágios. Por isso, às vezes eles nos parecem longos, embora as suas proporções não sejam realmente grandes.
O Minuete tem o frescor e a graça juvenil de todos os minuetes de Haydn.
O Vivace-final (sic) é um Rondó, forma em que o tema inicial, funcionando como refrão, aparece após cada nova seção musical, ou estrofe. Este movimento é um delicioso exemplo do eterno bom humor de Haydn. A música ri e saltita numa vivacidade encantadora, bruscamente afrouxa o andamento como que cansada, para depois retomar até o fim o seu turbilhonante ímpeto.

(Do Comentário ao 34º Concerto de Discos.)
O.A. I.S**

Haydn (Áustria, 1732-1809): Sinfonia em Mi Bemol Maior, nº 99.***



Duração: 25:31

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* Manuscrito de Oneyda Alvarenga, tinta preta.
** Manuscrito de Oneyda Alvarenga, tinta preta.
*** Repetição do 34º Concerto de Discos.

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